terça-feira, 26 de janeiro de 2010
do p.A.Vieira - consonância e dissonância
-"A filosofia da consonância e dissonância ainda em uma só palavra, ou sílaba, é tão admirável, como pouco advertida. Sendo a consonância, concórdia do som, e a dissonância, discórdia; e sendo o som um movimento sucessivo, que perde uma parte, quando adquire outras; é certo que quando a parte que soa e existe no ouvido, se ouve, a parte que passou já não se ouve, porque já não existe, nem soa: como pode logo ser, que do que se ouve, e do que se não ouve,se forme a consonância ou dissonância? O como, ou modo natural desta filosofia, é,que a parte do som que passou, ainda que já não soa, nem existe no ouvido, existe, porém, e persevera na memória: e da parte do som passado, que persevera na memória, junta com a parte do som presente, que continua no ouvido, resulta entre o ouvido e a memória a consonãncia ou dissonância das vozes. Troquemos agora os sentidos, e do ouvir passemos ao ver, e entre os olhos e a memória veremos no nosso caso a mesma maravilha. Ponha-se neste formoso teatro a memória defronte da vista, e a vista defronte da memória; e na contraposição destes dois espelhos se verá a consonância maravilhosa do tema, isto é, da profecia com o profetizado, e a dissonância ainda mais admirável dos tempos, isto é, do passado com o presente. O passado tão descomposto, o presente tão modesto : o passado tão disforme, o presente tão reformado : o passado tão abominável, o presente tão louvável: o passado tão gentílico, o presente tão cristão: o passado tão ímpio, e o presente tão santo."
Subscrever:
Enviar feedback (Atom)
Sem comentários:
Enviar um comentário