sábado, 6 de fevereiro de 2010
do p.A.Vieira - as glórias
-" Mas ainda que autorizadas com tão especioso nome(as glórias), nenhum poder fazem à balança porque são tão vãs como o mesmo mundo, e ainda mais, se pode ser. E se não discorrei por elas com qualquer átomo de consideração. O que mais pesa, e o que mais luz no mundo, são as riquezas. E que cousa são as riquezas, sendo um trabalho para antes, um cuidado para logo, e um sentimento para depois ? As riquezas, diz S.Bernardo, adquirem-se com trabalho, conservam-se com cuidado, e perdem-se com dor. Que cousa é o ouro e a prata, senão uma terra de melhor cor ? E que cousa são as pérolas e os diamantes, senão uns vidros mais duros ? Que cousa são as galas, senão um engano de muitas cores ? Cabelos de Absalão, que pareciam madeixas, e eram laços. Que cousa é a formosura, senão uma caveira com um volante por cima ? Tirou a morte aquele véu, e fugis hoje do que ontem adoráveis. Que cousa são os gostos senão as vésperas dos pesares ? Quem mais as canta, esse as vem a chorar mais. Que cousa são as delícias senão o mel da lança de Jónatas? Juntamente vai à boca o favo e o ferro. Que cousa são todos os passatempos da mocidade, senão arrependimentos depositados para a velhice ? E o melhor bem que podem ter, é chegarem a ser arrependimentos. Que cousa são as honras e as dignidades, senão fumo ? Fumo que sempre cega, e muitas vezes faz chorar. Que cousa é a privança, senão um vapor de pouca dura ? Um raio do sol o levanta, e outro raio o desfaz. Que cousa são as provisões e os despachos grandes, senão umas cartas de Urias ? Todas parecem carta de favor ; e quantas foram sentença de morte ! Que cousa é a fama, senão uma inveja comprada ? Uma funda de David que derriba o gigante com a pedra, e ao mesmo David com o estalo. Que cousa é toda a prosperidade humana, senão um vento que corre todos os rumos ? Se diminui, não é bonança ; se cresce, é tempestade. Finalmente, que cousa é a mesma vida, senão uma alâmpada acesa, vidro e fogo ? Vidro, que com um assopro se faz : fogo, que com um assopro se apaga."
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