segunda-feira, 12 de abril de 2010
Do p.António Vieira - as negações e as privações
-" Os filósofos distinguem dous géneros de negações : umas se chamam puras negações, e outras a que deram nome de privações. A pura negação nega o acto e mais a aptidão ; a privação supõe a aptidão e nega o acto. O silêncio é negação de falar, mas com grande diferença no homem e na estátua : na estátua é pura negação, porque a estátua não fala, nem é apta para falar, senão inapta ; porem no homem é privação, porque ainda que o homem não fale é apto e capaz de falar. Daqui se segue que assim como o silêncio na estátua é incapacidade, e no homem virtude, assim o que se nega ao indígno, é pura negação, a qual o afronta, e o que se nega ao digno, é privação que o honra e acredita, e tanto mais, quanto mais for digno. Tais são as negações que os príncipes fizerem e devem fazer aos seus validos. São privações com que não só se acredita a si, senão também a eles, porque o maior crédito do valido é que a sua privança seja privação. Por isso os validos com mais nobre e heróica etimologia se chamam privados. E quando eles folgarem de o ser, ou o príncipe fizer que o sejam, ainda que o não folguem, as privações dos privados farão mais toleráveis as negações dos que o não são. E desenganados os demais com este exemplo, nem eles se atreverão a pedir o que se lhes deve negar, nem o príncipe será forçado a negar o que lhe pedirem, ficando livre por este meio de muitas e molestas ocasiões, em que contra o decoro e agrado da majestade seja obrigado a dizer não. "
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