quarta-feira, 2 de junho de 2010

do p.A.Vieira

          - " Pinta-se o amor sempre menino, porque ainda que passe dos sete anos, como o de Jacob, nunca chega à idade do uso de razão. Usar de razão, e amar, são duas cousas que não se ajuntam. A alma de um menino que vem a ser ? Uma vontade com afectos, e um entendimento sem uso. Tal é o amor vulgar. Tudo conquista o amor, quando conquista uma alma ; porém o primeiro rendido é o entendimento. Ninguém teve a vontade febricitante, que não tivesse o entendimento frenético. O amor deixará de variar,se for firme, mas não deixará de tresvariar, se é amor. Nunca o fogo abrasou a vontade, que o fumo não cegasse o entendimento. Nunca houve enfermidade no coração, que não houvesse fraqueza no juízo. Por isso os mesmos pintores do amor lhe vendaram os olhos. E como o primeiro efeito, ou a última disposição do amor, é cegar o entendimento, daqui vem, que isto que vulgarmente se chama amor, tem mais partes de ignorância : e quantas partes tem de ignorância, tantas lhe faltam de amor. Quem ama, porque conhece, é amante ; quem ama, porque ignora, é néscio. Assim como a ignorância na ofensa diminui o delito, assim no amor diminui o merecimento. Quem, ignorando, ofendeu, em rigor não é delinquente ; quem, ignorando, amou, em rigor não é amante. "  

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