sábado, 18 de dezembro de 2010
do p.A.Vieira - no sermão do nascimento da mãe de Deus
-" Os homens (deve de ser porque são mortais) o que costumam festejar com maiores demonstrações de gosto, parabéns e aplausos, assim pública, como privadamente, são os nascimentos. Mas isto de nascer, pelo que tem de si, nem merece alegria, nem tristeza; antes, se bem se considera, mais digno é de tristesza, que de alegria. Não debalde com ser o risível a primeira propriedade de nossa natureza, a mesma natureza nos ensina a nascer chorando. Com lágrimas choraram muitas nações os nascimentos que nós solenizamos com festas, e não sei se nos deveram tornar o nome de bárbaros, que lhes damos. Queixamo-nos da vida, e festejamos os nascimentos, como se o nascer não fora princípio da mesma vida, que nos traz queixosos. O nascimento é o princípio da vida, como a morte o fim : e uma carreira que tem o fim tão duvidoso: uma navegação que tem o porto tão pouco seguro, como pode ter o princípio alegre? Nascemos sem saber para que nascemos, e bastava só esta ignorância para fazer a vida pesada, quando não tivera tantos encargos sabidos. Os ditosos e os desgraçados todos nasceraqm, e como são mais os que acusam a fortuna, que os que lhe dão graças, maior matéria dão os nascimentos ao temor que à esperança. A esperança promete bens, o temor ameaça males, e entre promessas e ameaças tanto vem a se padecer o que se espera, como o que se teme. A quem começa a vida, tudo fica futuro, e no futuro nenhuma distinção há de males a bens, todos são males, porque todos se padecem. Os males padecem-se, porque se temem; os bens padecem-se, porque se esperam : e para afligir o mal, basta ser possível; para molestar o bem, basta ser duvidoso. Se alguma cousa nos pudera segurar os sobressaltos desta contingência, parece que era o tempo, o lugar, e as pessoas de que nascemos; mas por mais que destas circunstâncias conjecture a vã sabedoria felicidades, o certo é que nem o tempo as influi, nem a pátria as produz, nem dos mesmos pais se herdam. Do mesmo pai nasceu Isaac e Ismael, e um foi o morgado da fé, outro da heresia. Na mesma hora masceu Jacob e Esaú, e um foi amado de Deus, outro aborrecido. Na mesma terra nasceu Caim e Abel, e um foi o primeito tirano, outro o primeiro mártir. Assim que avaliar o nascimento pelos pais, é vaidade; medi-lo pelo tempo, é superstição; estimá-lo pela pátria é ignorância; e só julgado pelo fim, é prudência."
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